Edições Antigas >> Edição n° 7 >> Máterias >> Ciências - Bactérias e Biobarreiras Ambientais

Bactérias podem produzir algumas substâncias extracelulares compostas principalmente de polissacarídeos (açúcares) e formar o que se conhece por biofilme bacteriano. O acúmulo dessas substâncias podem causar o entupimento de um meio poroso e influenciar o fluxo de água e o transporte de substâncias através deste meio poroso.

A formação destes biofilmes bacterianos pode ter impactos negativos, causando o entupimento de poços, por exemplo, através do abundante crescimento bacteriano na região adjacente ao mesmo. Pode ainda causar uma redução do fluxo em uma rede de canos num sistema de distribuição de água, através do acúmulo de massa bacteriana nos canos ou mesmo através da corrosão dos mesmos.

Uma das várias aplicações positivas dos biofilmes bacterianos diz respeito à tecnologia de biobarreiras. Biobarreiras são barreiras físicas formadas por microrganismos num ambiente subterrâneo, com a função de separar áreas adjacentes. Estas biobarreiras são importantes para minimizar danos ambientais após derrame de produtos perigosos, como óleo e produtos químicos, separando os produtos perigosos dos aqüíferos e corpos d'água.

Os biofilmes também têm utilidade na indústria do petróleo, no que diz respeito ao melhoramento da recuperação do petróleo em zonas subterrâneas permeáveis. Para entender melhor este processo, convém falar um pouco sobre os métodos de recuperação de petróleo. A produção de óleo convencional ocorre em três estágios: primário, secundário e terciário. A produção primária é o resultado da pressão interna do reservatório de óleo que existe na formação rochosa. Quando esta pressão interna diminui a ponto de diminuir a produção de óleo, pode-se então aplicar os métodos secundários. Estes consistem na injeção de água através de poços injetores, que empurrará o óleo da formação em direção ao poço produtor. Quando a extração da água for maior que a do óleo, o processo deixa de ser economicamente viável. Um outro problema que pode surgir em tal operação é que a água pode mover-se preferencialmente através de um estrato mais permeável na formação rochosa, podendo "ignorar" o óleo contido nos estratos menos permeáveis. Géis, resinas, argilas e cimento são exemplos de materiais comumente usados como agentes tamponantes (obstrutores) destas zonas de alta permeabilidade, com a finalidade de redirecionar o fluxo da água que foi injetada. No entanto, eles apresentam as desvantagens de não penetrar profundamente na formação rochosa e de ter alto custo.

Um dos métodos que têm sido explorados para o tamponamento ou obstrução de uma zona subterrânea permeável é o das biobarreiras, que envolve o uso de bactérias e de seus produtos metabólicos. A utilização de microrganismos como um dos processos terciários de recuperação do petróleo é referido pela sigla MEOR (do inglês microbial enhanced oil recovery) e atualmente vem recebendo interesse mundial. Um destes processos, que ainda está em fase de testes laboratoriais, começa com o isolamento de linhagens de bactérias a partir de amostras de água/óleo e que, após submetidas a um período de desnutrição, tornam-se pequenas células arredondadas (com aproximadamemte 0,4 µm de diâmetro), referidas como ultramicrobactérias (UMB). Culturas de bactérias são desnutridas em laboratório e as UMB então podem ser injetadas no reservatório e serem carregadas pelo fluxo da água até as zonas de alta permeabilidade. Nutrientes específicos são injetados no reservatório e as UMB retornam ao tamanho normal, multiplicam-se e produzem cápsulas ou camadas gelatinosas extracelulares (EPS) nas zonas de alta permeabilidade, formando uma biobarreira, que irá bloquear os poros nestas áreas e desviar o fluxo da água para as regiões menos permeáveis do reservatório, resultando num aumento da produção do óleo.

Outros usos da tecnologia de biobarreiras, empregando as ultramicrobactérias (UMB), estão sendo mundialmente estudados e podem tornar-se comercialmente disponíveis num futuro próximo.

Nelma R. Segnini Bossolan
B ióloga - IFSC - USP
nelma@if.sc.usp.br